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Sintra/Miranda do Douro, Portugal
Gosto de pintar,de escrever e de fazer trabalhos manuais.Sou simples e verdadeira. Tenho que pôr paixão naquilo que faço, caso contrário fico com tédio. Ensinar, foi para mim uma paixão; escrever e pintar, continua a sê-lo. Sou sensível e sofro com as injustiças do Mundo. A minha primeira língua foi o Mirandês. Escrevo nessa língua no blog da minha aldeia Especiosa em, http://especiosameuamor.blogspot.com em Cachoneira de Letras de la Speciosa e no Froles mirandesas.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Entre arfares


Era diferente de todas as outras. As próprias brincadeiras tinham outra graça.
Diziam as mães das demais, que a menina da Guiomar nem sequer a terra lhe pegava ao vestido. Parece filha de rainha, aquela menina.
Mas não era, fora concebida no meio dos fenos altos e verdes da Primavera que é a altura dos cios, misturados com os cios da natureza. Já com cinco filhos, o marido sempre adoentado, uma vida de privações a comer o que a terra dava com o suor derramado em cada horta , em cada lameiro e penhasco do fim do mundo, Guiomar trocava as voltas ao marido fingindo dormir, porque mais filhos era coisa que não lhe faria falta naquela idade avançada pare a maternidade.
Jesus, homem, parece que até me envergonhava dos meus outros filhos, não pensassem que ainda andávamos com poucas vergonhas, dizia Guiomar ao homem quando o sentia mais entusiasmado. Com estas palavras não havia entusiasmo que resistisse aos seus cinquenta e cinco anos já feitos, virava-se para o lado e adormecia.
Não adiantou nada! Naquela tarde, de enxada na mão, começou a olhá-la com olhos de carneiro mal morto e quando ela deu conta já a estava a puxar para o chão, atrás de um qualquer arbusto, entre fenos altos. Foi assim que Maria fora concebida, em arfares de gozo e ataques de bronquite que não largavam o homem. Parece que até os olhos lhe iam saltar das órbitas.
Costumava ter esses ataques de tosse, sempre que por qualquer motivo se entusiasmava e se ria e então no Inverno, no meio de uma constipação, de o sentir tão apoquentado, até apetecia tossir por ele para lhe aliviar o sofrimento.
Que menina tão linda, diziam as parteiras, curiosas da aldeia, que de tantos partos assistirem eram autênticas parteiras profissionais. Então não sei a quem se sai, dizia Guiomar ainda cansada do trabalho de parto que durou dois dias.
Foi o presente que o homem lhe quis deixar, uma menina, para que daqui a uns anos tratasse dela. Cansada pela dureza da vida e pelos quase cinquenta anos, não tardaria a ser velha e uma filha tardia é o ancoradouro dos pais.
Parece que adivinhava o Chico; morreu no cair da folha seguinte.
Ao menos ainda conheci a Maria, dizia ele quando, no pouco ar que respirava, ainda arranjou ar para umas palavras, no leito de morte, dirigidas a Guiomar o aos outros filhos, a maioria já casados e com descendência.
Não fosse a grande confiança que depositava em Guiomar, diria que aquela filha não seria das sementes da sua colheita. O mesmo dizia o povo da aldeia e aldeias vizinhas, sempre pronto a dar facadas nas vidas alheias. Não, neste caso ninguém ousou levantar a mínima suspeita. Todos conheciam a pureza de carácter de Guiomar, ninguém ousou nem por sombras, duvidar da paternidade de Maria, apesar do seu ar de princesa.

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