Acerca de mim

A minha foto
Sintra/Miranda do Douro, Portugal
Gosto de pintar,de escrever e de fazer trabalhos manuais.Sou simples e verdadeira. Tenho que pôr paixão naquilo que faço, caso contrário fico com tédio. Ensinar, foi para mim uma paixão; escrever e pintar, continua a sê-lo. Sou sensível e sofro com as injustiças do Mundo. A minha primeira língua foi o Mirandês. Escrevo nessa língua no blog da minha aldeia Especiosa em, http://especiosameuamor.blogspot.com em Cachoneira de Letras de la Speciosa e no Froles mirandesas.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Cansadas...

Estão cansadas, as flores...

Há nuvens negras a poente
Onde Vénus despertou.
As flores estão cansadas
Do jardim que lhes calhou
Dos aditivos
Dos cortes
Das fomes
E da primavera
Que não as amou.
Estão tristes, as flores...

sábado, 24 de julho de 2010

Poeticamente...


Às vezes, antes que os meus dedos escrevam, no meu corpo eu sinto ondas de musicalidade daquilo em que penso, mesmo que não pense em palavras, não pense em frases com que possa fazer um texto, uma palavra que seja. Ondas de musicalidade a virem-me nem sei de onde, música a rimar em poemas.

Tentei desenhar letras com essa música mas as pálpebras pesaram-me até que, os cílios finalmente uniram-se em toques leves.
Dormi uma pequena sesta no sofá da sala, depois de ter fechado todas as janelas. Uma mosca insistia no seu zumbido. Odeio moscas, odeio-as tanto que era capaz de lhes infringir um assassinato colectivo. Odeio moscas e odeio muitas mais coisas, já que tenho mau feitio...
Odiar não, acho que não odeio seja o que for, ódio não, apenas intolerância.
Há que dar musicalidade poética à vida para que a vida possa suportar as intolerâncias...

Uma das coisas é o maldito pano do pó assim como o aspirador e a vassoura. Com eles até urticária sinto nas veias. Prefiro uma enxada, mesmo que de pontas longas a furar a terra, a dobrar-me os quadris e a contrair-me as vísceras...
Olhei a mesa e, a presumível transparência do tampo de vidro que cobre um trilho (utensílio com que se debulhava o cereal), tinha uma opacidade de rocha branca. É preciso pôr as mãos à penosa obra de acabar com o pó da sala que afinal tinha sido limpa ainda havia menos de uma semana.
Peguei no objecto do meu suplício e lancei-me à mesa. Limpei-lhe o pó, depois lavei-a com um pano molhado e sequei-a com um jornal de notícias amareladas. Como que em sonho, toquei piano enquanto limpava, eu que de música nada sei. Fui tocando, tocando, acariciando teclas, voltando folhas da partitura. A mesa ficou impecavelmente limpa, primorosamente tocada pelos dedos leves do jornal cada vez mais desfeito de suas bombásticas notícias.

Os móveis são de cera, como era o pequeno móvel feito de madeira de eucalipto onde a minha infância guarda as loiças de festa. Claro por dentro e escurecido por fora à custa do tempo e do fumo que viajava por toda a casa, enquanto não existiu a humilde chaminé. O único móvel que havia para além dos escanos, esfregados com água e sabão azul e as arcas de madeira onde se guardavam as roupas de casa e de vestir. Por falta de espaço muitas coisas se atafulhavam debaixo das camas de ferro encostadas à parede e tapadas as misérias com a dianteira, um pano branco bordado e com renda que se prendia debaixo do colchão de palha e que tapava todo o recheio familiar e supria a falta de móveis.
Cera virgem de abelha lhe punha a minha avó e lhe puxava o lustro com uma meia de lã de ovelha cravejada de remendos e de buracos, tricotada pelas mãos hábeis da minha mãe. Muito próximo estava a mosqueira e dela me chegou o cheiro a toucinho, a chouriça cozida e a todas as coisas que era preciso conservar na despensa fresca, quando a electricidade descia pelos fios da candeia até ao prato.

Peguei na cera, subi ao colo da minha mãe e da minha avó Ana e esfregando o pano vezes sem conta trouxe aos móveis de antiquário, de casas doutras infâncias, um brilho e vida que seguramente nunca teriam tido, um brilho poético porque poeticamente polidos com a meia de lã de ovelha da minha memória. Um brilho de fazer inveja à velha caldeira de cobre esfregada com cinza e aos potes de ferro que trazem o brilho da areia das valetas do caminho, depois de passar a enxurrada e que cheiram a sabão em barra, azul e branco a lembrar o céu.
Poeticamente...
Poeticamente, enfeitiçando as minhas intolerâncias...

O fim da clausura

Estive este tempo todo sem internete por uma razão que ainda não descobri. É quase impossível suportar essa solidão nos tempos de hoje. Com outro computador a janela abriu-se enfim...
Fui escrevendo sem que pudesse publicar mas, não é a mesma coisa. Sinto necessidade de comunicar e, fazendo-o através dos blogues, eu sinto que falo com o mundo.
A quem me segue, as minhas desculpas e o meu obrigada.

Nas constelações da minha alma


É apenas mais um lugar onde me sento,
onde pisei searas de trigo
para ser formiga
em cerejeira de tronco rugoso.
Elas doces, negras, magras
que de tão magras,
o caroço lhes saía nas costelas.
E poucas, tão poucas!...
E belas, tão belas!...
Belas, apetitosas e únicas,
como única é a infância
feita de aromas silvestres...

Não foi este o meu casulo,
o meu canto dos silêncios
mas daqui eu posso vê-lo,
lá em baixo na aldeia, meu ninho,
aonde sempre me abeiro,
de mansinho...

Daqui vejo o sol a ir-se,
bola incandescente
tocando a silhueta dos montes
onde os meus sonhos de infinito poisam.
E vejo fontanários
e vejo fontes
e cântaros no parapeito
esperando uma fala apressada.
E vejo tudo,
vejo tudo, em nada...

Quando finalmente o sol me deixa
e Vénus se me faz confidente,
apago os candeeiros da rua
E vejo candeias somente
E vejo crianças
e muita gente...
Gente que trabalha numa canseira infinda,
Esfarelando o pão com as mãos calejadas,
sente tudo,
em troca de nada...

E depois,
em cada casinha,
com sua janela discreta,
eu vejo
o nascer de uma estrela,
trémula, frágil, inquieta.
Atrás dessa, outras,
alumiando serões
e na minha aldeia eu vejo
brilhantes constelações.

A lua de tão confusa
de ver tantas estrelas na aldeia,
humildemente deixou-se
cair inteirinha,
Cheia.
E eu,
... eu vi-te
à luz da candeia!...

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Agarro-me

Agarro-me à vida
Como que a segurar esmeraldas
Dum mar imenso em mim
Grinaldas de rubis de Outono
Que me enfeitam
Onde em silêncio me entrego
Me abandono...
Agarro-me à esperança
Venço as dores de que padeço
Sacudo, choro
Canto, sonho
E em ti adormeço.
Acordo em ti
Abraço-te
Agradeço...

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Hoje sinto-me a ave fria, de luto

No último texto que escrevi, falava eu da cotovia que morreu de sede e de pranto por lhe terem tirado a pedra, onde, bem no centro, na covinha, fazia o sumo de amora e bebia com a palhinha de centeio.
Nem de propósito eu poderia ter escrito um texto tão oportuno! A cotovia poderia ter morrido também, se acaso tivesse ressuscitado...
Nasci numa casinha de pedra. Encostada à casa eram os estábulos e o palheiro da tia Chica Barriguita. Depois era mais um pedaço de casa onde me lembro de ver grandes arcas, estendendo-se em L a oficina de Ferreiro do meu avô fechando a seguir com a pocilga dos porcos em redondo. Mais tarde adquiriram as lojas da tia Chica ficando assim um pátio fechado não tivesse o meu avô derrubado o muro e o portão, ambos altos, porque a ruela contígua, a um nível mais baixo, era demasiado estreita e não havia largueza desejável para passarem os carros de bois das pessoas que ali moravam ou lá tinham os estábulos.
O tio Avelino, meu avô, não era capaz de negar um favor e assim, muro e portão foram abaixo, quando a minha mãe era criança, conta ela. Só me lembro do pedaço de muro, exactamente naquele ponto da ruela, abrindo-se mais desafogada em frente a estábulos, já não precisava do terreno de cima. A terra num nível superior foi caindo com o efeito do tempo e da chuva, alargando cada vez mais a ruela. Viam-se perfeitamente no chão as marcas dos limites, porque a estreita rua era de pedra, um calcetamento que se via tinha sido feito com muita sensibilidade e bom gosto, pedra ao lado de pedra, umas mais lisas e de maiores dimensões, outras arredondadas. Aquelas pedras guardavam história e muitas brincadeiras de crianças que, até ao toque das trindades corriam como pássaros. A rua empedrada terá surgido no tempo em que aldeia surgiu ali, quando, dizia-me a minha avó, a aldeia teve que sair do sítio de S. Lourenço por causa das formigas. Na falta de insecticidas para as combaterem, tiveram que mudar a aldeia. Resta lá a cruz da capela a vigiar a minha casa, construída recentemente naquele lugar.
Dói-me a alma só de pensar na escuridão do alcatrão e sinto calor aqui bem longe, como se lá estivesse, só de pensar o quão viscoso o sol o tornará no estio rigoroso do nordeste.
Hoje sou cotovia triste, mais uma vez, porque mais uma vez apagaram as marcas da história dos meus antepassados e desta vez, má sorte, com pazadas de alcatrão que detesto.
Tivesse ao menos feito uma despedida digna quando pela última vez há um mês e picos te vi!
Quem me dera ter sabido e olhar-te-ia longamente na derradeira vez. Iria seguir e sempre olhando como uma mãe a despedir-se dum filho condenado à morte.
Sou de novo cotovia, ou ave fria, de luto, triste e fria, como frias são as mentes que nada preservam.
Que haja progresso mas que esse progresso não se faça à custa do desmantelamento dos vestígios dos nossos antepassados.
Calçada linda que me miraste em todos os acordares, adeus!

domingo, 4 de julho de 2010

Em mim...

Vive em mim uma andorinha, aquela que quando dei o primeiro grito para experimentar a eficácia dos pulmões e a partir do qual fui eu inteira, poisou no parapeito da pequena janela vestida de vidro riscado do quarto que me serviu de maternidade, sem marquesa, sem médico ou enfermeira e onde de cócoras a minha mãe me lançou nas mãos da minha avó, ali bem junto ao sobrado de tábuas esfregadas com escova e sabão azul.
Era Maio. Não me lembro que tempo fazia. Presumo que seria bom tempo e que as andorinhas esvoaçassem para retocar os ninhos com o barro arrancado ao ribeiro ou ao buraco escavado na terra vermelha donde antes as gentes sacavam o barro para moldar as telhas que seriam cozidas no forno. O forno da Fontásia ainda me lembro sempre que por lá passo e vejo o buraco atafulhado de lixo e silvados.
Há uma andorinha em mim, aparentemente exuberante mas no fundo discreta como uma flor silvestre, uma violeta da beira do caminho, sequiosa de aventura e de mundo.
Há uma andorinha em mim a transportar o barro vermelho com que construa as telhas tão poeticamente belas para refazer os telhados da minha infância que uma moda de novo riquismo as extinguiu para deixar os telhados altivos, vestidos com telhas de diferentes cores que graciosamente descascam em cada inverno sempre que as geadas lhes congelam os pigmentos.
Há telhas em mim, também há telhas, daquelas de barro sepultadas num fosso de esquecimento! Daquelas de vermelho acastanhado, cobertas de história e musgo onde passarinhos poetas saltitavam para ver o céu mais perto, e a lua e com ela fazerem poemas.
Há uma andorinha em mim. Às vezes sim, outras não! Já não sei!...
Outras, há cotovia de cantar triste, tão triste que faz chorar a pedra onde fazia o vinho de amoras, ali debaixo da amoreira, na covinha bem no centro e que depois sugava aquele vermelho de lábios virgens, com uma palhinha de centeio. A cotovia do meu coração triste já não tem onde beber o sumo de amora, porque a pedra, aquela que lá está é cinzelada, lisa de painel de vidro de novos ricos.
A cotovia que havia em mim morreu de sede e de pranto!
Desisto de ter em mim o que quer que seja… mas quero tão só, estar em cada andorinha, em cada cotovia ou cuco, gaivota, rouxinol ou albatroz e agarrada às suas asas voar, voar cantando!

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Em relógios de lua

Desde que experimentei o verdadeiro silêncio,
deixei de temer a morte.
Que mais pode ser a morte
que um silêncio prolongado...
Aquele silêncio
em que o relógio que o pode marcar
é o relógio solar
ponteiro dirigido ao céu,
sem tic-tac.
Desde que conheci o verdadeiro silêncio,
deixei de ter medo da vida,
da vida que come o silêncio...
Conto-me no relógio de areia,
uma a uma
se deixa tombar,
a contar os segundos,
sem ruído de ponteiros,
nem cucos a espreitar.
É nesse marcar de tempo
sem tic-tac de solidões
que me nascem orquestras de silêncios
em ondas a levarem-me ao céu
como que na derradeira viagem,
com o tempo contado
em relógios de lua...
Que mais será a morte
que um silêncio,
onde o compasso não vem da areia,
nem do sol,
mas tão só da lua,
donde mire o mundo com poesia,
donde continuarei a fazer-te poesia,
calma, serena,
a minha,
viva...
gravada pelo vento
nas dunas do meu silêncio...

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